REVIEW | South of the Circle é uma lição sobre as mudanças na vida

Sagitta Tech
6 min readAug 8, 2022

Games de point n’ click baseados em narrativa são um gênero de games que continua em alta nos últimos anos. Talvez o que mais atraia os desenvolvedores para esse tipo de jogo seja a facilidade de colocar uma boa história na forma de game sem ter que se preocupar com mecânicas complexas e visuais arrojados.

E é no meio desse mar de “games narrativos”, como se estivéssemos procurando um abrigo no meio de uma forte nevasca, surge South of the Circle: um jogo que promete entregar a jogabilidade mais simples possível ao jogador ao mesmo tempo que o envolve em uma história marcante com personagens bem trabalhados.

Uma cópia digital de South of the Circle para Xbox me foi cedida para análise pelo Terminals e, depois de passar várias tentando sobreviver nas inóspitas regiões da Antártica enquanto revia os momentos mais importantes da minha vida, trago uma review completa dessa criação mais recente da 11 Bit Studios.

Uma aventura narrativa diferente

A primeira característica que o jogador irá notar ao começar a história de South of the Circle é que, apesar de tratar de uma game narrativo, ele utiliza uma estratégia diferente para fazer com que o usuário interaja com a trama. Ao invés de opções claras de diálogo, você tem acesso à apenas sentimentos amplos que deve utilizar para reagir a uma fala. Além disso, cada opção de botão tem um tempo de reação para ser escolhida, caso contrário, seu personagem ficará quieto sobre o assunto.

Quando essa estranha mecânica de interação é apresentada pela primeira vez, para cada botão são designados 3 sentimentos semelhantes, mas ao longo do game os detalhes desaparecem e o jogador precisa confiar nos símbolos de cada ação para saber como deve reagir. Demora um pouco para se acostumar, mas ao final das quase 5 horas de gameplay, a mecânica fica muito intuitiva e natural.

Felizmente essa mecânica inusitada está brilhantemente atrelada a um roteiro muito bem escrito e com personagens tão carismáticos que ao fim da história eu continuava interessado em saber mais sobre suas vidas. Junte a tudo isso um estilo artístico minimalista que deseja fortemente que o jogador se envolva apenas com a história e você tem uma experiência narrativa incrível (mas curta) que mostra como os jogos são capazes de contar histórias surpreendentes das mais diferentes formas.

Mesmo com um elenco pequeno e com boa parte dos diálogos se concentram entre o casal de personagens Perter e Clara, todas as falas são bem escritas e bem elaboradas, tornando as situações que ambos vivenciam muito realistas e dignas de estarem um filme de alta produção hollywoodiana. O uso evocativo das cores saturadas e as formas com linhas simples servem como uma pano de fundo bem costurado para lembrar ao jogador que em South of the Circle, não são seus olhos que os desenvolvedores querem agradar, mas sim seu coração.

Toda escolha implica em uma perda

O jogador irá experienciar South of the Circle pela perspectiva de Peter Hamilton, um professor da renomada Universidade de Cambridge que se encontra preso na Antártica depois de uma queda de avião. Com seu piloto ferido, a única opção de Peter é se arriscar pela região inóspita em busca de ajuda. Mas essa “aventura” é apenas metade do game.

A outra metade envolvem constantes flashbacks que se encaixam perfeitamente em diversas situações que Peter agora vive em busca de sua sobrevivência. Através dessas memórias que também serão experienciadas de forma interativa pelo jogador, é possível descobrir mais sobre as estranhas circunstâncias que levaram Peter até a a remota Antártica.

Sem revelar muitos spoilers sobre a trama, mas basta dizer que a vida de Peter parecia ter apenas um objetivo definido (se tornar um professor de sucesso em Cambridge) até o momento em que ele conheceu Clara, também pesquisadora na mesma universidade. A partir daí, a vida de Peter se torna uma sucessão de decisões que devem ser feitas com cuidado se ele quiser preservar tanto seu relacionamento com Clara quanto sua posição na universidade.

A história de South of the Circle flerta de forma superficial com diversos temas polêmicos dos anos 1970 como a ameaça comunista e o terror nuclear durante a Guerra-Fria, o acordo não-militar de exploração da Antártica e até questões de igualdade de gênero em ambientes profissionais e acadêmicos. Tais temas servem apenas como uma fina base para contextualizar as situações que os personagens vivem, mas nunca se aprofundam mais do que isso (por mais que você escolha as opções mais “polêmicas” de sentimentos).

O que você irá perceber até o fim dos créditos é que, no fim, toda a escolha implica em uma perda. South of the Circle reflete bem esse aspecto de nossas vidas, já que, como diz o ditado: “Não é possível agradar a todo mundo”. Infelizmente Peter precisa escolher entre seu amor por Clara ou sua carreira acadêmica. E talvez o que doa mais em nosso personagem e também no jogador é que, por mais que pareça que estamos tomando a decisão “correta”, ela nunca será tão benéfica quanto podemos sonhar.

Aos trancos e barrancos

Por se tratar de um jogo com enfoque na narrativa, não existe uma mecânica arrojada de gameplay em South of the Circle — a não ser a forma como as decisões são tomadas com base nos sentimentos. Sendo assim, ainda é bizarro tentar controlar os movimentos de Peter através de ângulos fixos das câmeras ou em veículos. Às vezes os controles podem não ser responsivos ou simplesmente os ambientes não indicarem claramente qual deve ser a próxima ação do jogador.

Existem alguns documentos e outros itens que você pode inspecionar tanto no presente quanto nos flashbacks para obter mais informações sobre as personagens ou situações específicas. Porém, a forma como você lê uma carta, por exemplo, é muito estranho pois tenta imitar a forma como os olhos se movem da esquerda para a direta e de cima para baixo quando leem um texto. Utilizar o analógico do controle para emular esse movimento não é intuitivo e, apesar de entender a proposta dos desenvolvedores em criarem uma experiência mais imersiva, essa mecânica simplesmente não funciona.

Novamente, sem querer relevar nenhum spoiler, outro aspecto da história de South of the Circle que pode decepcionar alguns jogadores (da mesma forma que eu) é como ela termina abruptamente. No fim, o fim se torna apenas “satisfatório” mas não é capaz de entregar uma conclusão apropriada nem para o arco da história de Peter quanto para as outras personagens. Depois de se envolver tanto com a trama é bizarro ver como não foi possível fornecer uma finalização adequada para a trama.

Uma boa história para se recordar

South of the Circle only é um jogo que você levará poucas horas para concluir. Mas mesmo nesse pouco tempo de gameplay ele certamente será capaz de marcar você por um longo tempo. Com um ritmo ágil, uma escrita excelente e uma mecânica de interação que, mesmo sendo diferenciada, é capaz de criar cenários que despertam sentimentos no jogador, o game é uma experiência incrível de viver. Alguns tropeços com as mecânicas de movimento e o final abrupto podem incomodar um pouco, mas eles são pequenos flocos de neve quando comparados à simples mensagem que o jogo quer passar sobre as consequências das escolhas em nossas vidas e nas vidas de quem amamos.

Opinião Final: OK

Por Luís Antônio Costa

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O Sagitta Tech é uma página dispara uma flecha certeira na direção do que é mais interessante no mundo da tecnologia e games, por Luís Antônio Costa.

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